Duas Redação sobre "Privilégios e Fortunas ameaçadas: entre o Ressentimento, a Luta de Classes e a Igualdade."
EXEMPLO 1 - Redação NOTA 9,0 (FUVEST):
Do pretérito vertical à incerteza
horizontal
A sociedade brasileira foi construída com
base na lógica dos privilégios, pelos quais a hierarquização de distinções
sociais – do acesso à terra ao poder de voto – reafirmavam a dominação vertical
de uma minoria privilegiada sobre uma maioria marginalizada. A lógica da
criação de direitos, que atua por uma via horizontal entre os agentes sociais,
foi gradualmente conquistada, tendo seu ápice após a redemocratização e a
Constituição de 1988. Ainda que princípios voltados à universalização de
direitos constituam a base teórica do regime atual, a sociedade brasileira é
composta por privilégios, os quais, porém, quando são interseccionados por
diferentes classes sociais, acabam gerando conflitos, em especial pela sensação
de ameaça sentida pela classe dominante ao ver que suas exclusividades já não
são mais tão exclusivas.
A estrutura de privilégios no Brasil
remonta suas origens desde o período colonial, com o autoritarismo social,
político e econômico que asfixiava a emancipação da população marginalizada,
como os escravos. Passando pela restrição do direito ao voto no Império e pelo
coronelismo da Velha República, observa-se o predomínio histórico de uma lógica
vertical de dominação, segundo a qual as diferenças – pautadas nos privilégios
– eram fatores de segregação. Essa distância entre privilegiados e
não-privilegiados refletia-se em uma tensão essencialmente indireta, já que as
fortunas não eram partilhadas pelos diferentes segmentos sociais.
Todavia, ocorre hoje uma intersecção entre
as classes, com o acesso das camadas mais baixas a esferas até então
identificadoras das camadas privilegiadas, o que vai desde a conquista de
espaço nas universidades, até a prática de costumes, como frequentar shoppings,
viajar para o exterior, consumir bens duráveis. Nesse sentido, a histórica
estrutura vertical e excludente é, ao menos simbolicamente, rompida por uma
expressão mais horizontal de acesso aos mecanismos que, em tese, deveriam ser
direitos (como educação, cultura e lazer). Por essa nova ótica, as distinções
entre os indivíduos são menos intensas, provocando um cenário que transcende a
luta de classes – que é baseada na nítida separação entre elas – para se
refletir em ressentimento de classe, isto é, na sensação de ameaça aos antigos
privilégios. Na prática, isso se revela em discursos preconceituosos e
intolerantes, por exemplo, em certas críticas às cotas raciais, críticas, estas,
que desconsideram o racismo e a escravidão como fatores que dificultaram a
conquista de direitos pela população afrodescendente do Brasil. As
universidades, assim, começam a deixar de ser símbolos de privilégios.
O ressentimento de classe é
consequência de um processo gradual de quebra da verticalidade impositiva do
sistema de privilégios; é efeito do conflito entre essa histórica estrutura e
outra mais recente, a partir do final do século XX, que perpassa por princípios
de justiça social. No entanto, ainda é necessário combater a solidez com que
foi construída a sociedade brasileira de privilégios para que, assim, haja espaço
à solidificação da estrutura democrática de direitos.
EXEMPLO 2 - Redação Nota 8,5 (FUVEST):
A Democracia dos Homens
Cordiais
No
livro Raízes do Brasil de Sérgio
Buarque de Holanda, o autor faz uma análise da sociedade brasileira. Na obra,
afirma que a democracia foi importada por uma aristocracia rural e feudal que
acomodou o regime aos seus direitos e privilégios. Por isso, a desigualdade
ainda assombra a sociedade democrática do ponto de vista social. Tal situação
descrita pelo sociólogo tende a se reverter, pois a luta pela igualdade
intensifica-se.
O
crescimento econômico associado ao progresso politico na maior parte dos países
implicou a saída de muitas pessoas do limiar de pobreza. No início do século
XXI, por exemplo, o PIB do Brasil aumentou. Ao mesmo tempo, famílias de baixa
renda foram beneficiadas por programas governamentais como por exemplo o Bolsa
Família. Segundo o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, houve
uma queda da desnutrição infantil de 12,5% para 4,8% entre os anos de 2003 e
2008 nas crianças que fazem parte do programa com idade inferior a cinco anos.
Portanto, ocorreram avanços significativos no que tange a diminuição da
desigualdade do ponto de vista econômico. Esse aumento do poder aquisitivo por
meio de ações do governo aproximou as camadas sociais criando um ressentimento
de classe entre os abastados. Para os privilegiados, equivale a uma “invasão de
servos ao manso senhorial”.
O
ressentimento gerado pela proximidade entre camadas está associada a um
pensamento feudal que permea o cenário contemporâneo. Na sociedade brasileira,
o “homem cordial” descrito por Sérgio Buarque de Holanda se faz presente: membros
da elite criam uma lógica de inclusão por exclusão, pois têm necessidade de se
sentirem privilegiados. Para fazer parte da camada social mais elevada, negam
as camadas mais baixas. Nesse contexto, fica evidente por qual motivo surgiram
muitas críticas da elite quanto a reivindicação de direitos trabalhistas pelas
empregadas domésticas recentemente. Entretanto, esses “homens
cordiais”encontram-se ameaçados uma vez que a democracia avança cada vez mais
no sentido da conquista da plena isonomia. Os direitos trabalhistas das domésticas
seriam um exemplo de vitória.
Em
suma, a democracia ainda não atingiu seu ápice. Estamos inseridos em um momento
de transição no qual a mentalidade da antiga aristocracia rural prevalece. A renda de todas as camadas sociais
elevou-se, mas a desigualdade permaneceu em outros âmbitos. Diante de tal
situação, os “estamentos”com menor poder aquisitivo revoltam-se e lutam pela
isonomia.
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