As Demandas da Sociedade e Medicina por Vocação ou Status?



"Segundo o modelo de Marx, a democracia socialista teria que conduzir a um desenvolvimento da pessoa humana nunca antes conhecido, portanto, também à sua liberdade. A democracia socialista não teria que rechaçar os sucessos da democracia burguesa, mas sim levá-la a um nível mais alto."
 [Adam Schaff]


Uma nadadora de 64 anos, Diana Nyad, fez a travessia Cuba/Flórida em 52 horas, depois de 30 anos tentando. Foram 5 tentativas em 30 anos. Uma história de superação extraordinária. Ao chegar exausta à praia disse três coisas: "1) Nunca desista de seus sonhos; 2) Nunca aceitem que digam que você está velho demais para o que sonha; e 3) Dizem que a natação é um esporte individual, mas a verdade é que a natação é um ESPORTE em EQUIPE". Imediatamente lembrei dos alunos que estão no cursinho há três anos ou mais. Lembrei de uma Equipe por base, como Coordenador de Redação observo, que vem fazendo toda a diferença nos resultados que obtivemos. Mas antes vou ao ponto que mais me motiva a escrever este texto: as demandas de uma sociedade por status e de rara vocação. 


Definitivamente, as demandas de uma sociedade não são pela sua saúde. Há uma ambiguidade latente na sentença anterior. Em primeira leitura, podemos entender tanto os desejos e anseios de uma maioria de uma sociedade, medida por uma espécie de IBOPE, não são necessariamente coisas produtivas e saudáveis para o próprio corpo social, por exemplo, não vejo benefícios nas sinapses do cérebro social, o mesmo benefício que há nas veias sociais por termos uma nação em que 60 milhões de expectadores assistem Faustão no domingo, há mais de vinte anos. O que mais assusta e aflige o corpo social é saber que temos e acabamos de atingir 200 milhões de habitantes na terra pátria. Em segunda leitura, podemos entender que as demandas da sociedade capitalista, de uma classe média inchada que busca status e não cuidados com o corpo social acaba gerando um descuido maior com a Saúde do Brasil, o programa Mais Médicos e modo xenofóbico, corporativista e classista que vemos a cada dia em nossos noticiários diz muito sobre isso: a vaia à chegada dos médicos cubanos na semana retrasada no aeroporto em Fortaleza diz muito. As demandas de interesses sociais estão mais fragmentadas e vivas que uma grande demanda pode parecer cobrar e solucionar. Vivemos em um mundo cada dia mais cheio de possibilidades e diversidades, por isso o discernimento humano e a autonomia são duas pernas de um corpo saudável, que precisa se exercitar frequentemente para manutenção do bom fluxo bio-organo-químico.

Nos 5 (cinco) últimos anos convivi de perto com os primeiros colocados na considerada melhor faculdade de medicina do país. Digo, que convivi com os primeiros colocados, literalmente, pois escolhi fazer isto e temos uma equipe para isto, de 2011/12 até 2014/2015, por tratar com eles textos, modos de pensar, modos de acertar a  palavra e dar motivação para ir mais além. Mas convivi com uma quantidade, até hoje na minha vida, muito maior de seres humanos que não passaram em MEDICINA na PINHEIROS, contudo os primeiros colocados nestes dois últimos anos tinham em comum uma coisa: eram extremamente profissionais à carreira de estudante, pois eram humildes. Buscavam ajuda para o que não sabiam, escutavam e depois traziam textos reescritos conforme a conversa que tínhamos tido. Estudantes exemplares. Seres humanos que deixam saudade. Porque sabiam que tinham que se preparar para o melhor. Sabiam que já não bastava ficarem isolados, precisavam de uma equipe de interlocutores para dar vazão ao que sabiam, e mais para ter contato com aquilo que ainda não sabiam e irão conhecer: o universo inesgotável que é o ser humano ao longo do viver. Tinham mais uma característica comum: a certeza que o estudo é o caminho, dosado entre autonomia e a ajuda da equipe.

Nesta última semana, atentei-me a três histórias: uma aluna de 5 anos de cursinho, não prestará mais MEDICINA na USP, mas FARMÁCIA; outra, com 2 anos em cursinho, prestará LETRAS na FUVEST e nos outros MEDICINA; e uma última voltou para o cursinho, no qual já havia estudado 4 anos, pois havia passado em uma faculdade de medicina estadual em São Paulo e seu grande sonho é a PINHEIROS. As três agiram acertadamente. Com autonomia, com uma convicção que a vida traz, quando se vive e se exercita o viver ouvindo e analisando.

Não posso dizer que é um dos processos mais desumanos do mundo, embora seja bem desumano, prestar MEDICINA no Brasil, ainda mais para a PINHEIROS, que acaba recrutando aqueles que melhor se preparam no sistema de ensino, na maior parte privado deste país pós privatizações neoliberais. Contudo, sei porque convivo com os desgastes de muitos alunos, e o tempo todo fico incentivando para que entendam a prova, que façam a prova, que exercitem a prova, pois o conhecimento está neles, bastaria, portanto, colocar com AUTONOMIA e leveza todo o siso de conhecimento que já carregam. Mas para isso é preciso ter a humildade de reconhecer a condição da derrota iminente. Digo, é preciso ter a noção de que saber fazer prova é exercitar a prova, ouvir cada detalhe informativo das aulas, mas filtrar em si mesmo o conhecimento. Informação pode gerar conhecimento, se discernido, apurado, pensando, filtrado, se ouvido.

Alunos com bom rendimento individual têm uma equipe atenta por perto, uma família atenta, quando não, têm professores atentos, um pedagógico atento, uma coordenação atenta. Noto isto, porque lido diretamente com 80 pessoas em uma rede que cuida dos alunos, e um grupo maior ainda mais nas bases. O resultado é produto de um trabalho em equipe. Na vida, em tudo, não tenho mais dúvidas, o resultado vem do que se tira de bom e do discernimento em equipe e para si - autonomia e humildade andam juntas. Costumo dizer aos meus, nosso carácter CO - LABOR - ATIVO. Uma ação conjunta de trabalho em equipe que dialoga, que conversa, que age discretamente de forma capilar. Se foram 22 aprovações em um ano na Pinheiros, 37 em dois anos, em três, se encontrarmos alunos humildes e querendo muito o que querem teremos 175 vagas nossas,  mas é preciso ter conjunto, ter integração e menos exemplos de obtenção de conhecimento próprio, mas muito mais conhecimento partilhado. Assim agimos, assim somos, assim somamos.


Não tive qualquer influência nas escolha das três estudantes, a não ser a de me manter questionador em todas as atividades com elas. Uma disse-me convicta, que a paixão por medicina este ano mudou e que farmácia e veterinária são campos que mais a agradam. Achei sensível e bem orgânico o que ela disse. Caiu  nela uma ficha que em poucos caem, ou que pouco cai nos pais de muitos alunos. A vida não é status, ele ajuda, mas a vida é de conquistas humanas. Afinal o que é status? Senão qualidade de vida! Status hoje tem a ver com saúde social, bom ensino, respeito aos outros e a si mesmo, pois quando se cuida do OUTRO a resposta para si é respeitosa, pois sente-se que fez o melhor, pois foi para si e para o Outro. Sartre, filósofo francês do século XX, aponta que o PARA-SI não é EM-SI, pois parte do OUTRO em direção a SI, por isso PARA-SI. É uma espécie de eterno retorno da física aplicada ao mundo humano, já que toda ação tem sua reação. Se ajo para com o OUTRO de forma saudável, terei de meus OUTROS um retorno em QUALIDADE DE VIDA. Status é definitivamente Qualidade de Vida, qualidade de relações. Em comunidades pobres há muita qualidade de vida, em cidades do interior ainda há mais. Vide os dados da cidade de ARARAQUARA nos últimos anos, é a cidade com melhor qualidade de vida do país, há lá 200 mil habitantes, escolas públicas e privadas de qualidade acima da média do estado e planejamento urbanístico reconhecido, há lá qualidade de vida até em comunidades mais distantes do centro, o povo de lá vive bem, embora haja muito o que melhorar tanto lá quanto no Brasil todo.

A segunda estudante, escolheu LETRAS, porque é boa em redação, em português, em humanas e gosta dessa área. Escolha difícil, mas o pai disse "só não quero que faça um curso que não goste como eu fiz, porque depois você terá que trabalhar muito tempo com isto. Se você gosta de licenciatura e dar aulas, não há o que impedir". Belo exemplo de conversa em família. Contudo, ela irá prestar medicina nos outros vestibulares e provavelmente passa com sobras. 

A terceira estudante voltou para o cursinho, fazia Medicina em SJRP, e disse a si mesma e à família que o seu sonho é a Pinheiros. Neste caso, tem que tentar. Volta como uma candidata em potencial. Volta forte, fortalecida pela confiança da família e pela escolha dela mesma. E isto dá ânimo aos estudos. Isto faz na hora H saber os atalhos, pois ela sabe que já passou e sabe porque voltou. Mas poxa são 175 vagas na Pinheiros por ano. Só de alunos que estudam onde trabalho que prestam Pinheiros, este ano, são 1.700. A briga é boa, não diria desumana, mas boa.

Família é importante. Família é a nossa melhor equipe na vida toda.


Três histórias que rompem com a demanda de uma sociedade pouco saudável. Escolhas arriscadas dão mais fluxo ao corpo social. Três mulheres que acertaram em suas escolhas até então, cujas aprovações será um pequeno detalhe. São exemplos das escolhas que devem ser feitas a partir do que se sabe, do reconhecimento de si, e não de uma cobrança por status de ser médico, que hoje não é tamanho assim, se na maioria da classe que se formam a vocação ficou para escanteio. Por isso, muitos que estão a horas de escolher o CURSO no VESTIBULAR da FUVEST escolham com autonomia, com ponderação sobre si mesmo, porque sonho é bem mais forte que a ilusão do status. Sonho alimenta, ilusão desilude com o tempo, e ser médico é ter amor pela vida do outro como se defende a própria, e não simplesmente passar anos em uma carteira sem se questionar, ou duvidar de si mesmo.

Faça sua escolha e saiba: agora é com a gente, e eu não vou te deixar fugir ao sonho!

Fabrício Oliveira
Coordenador de Redação

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