O que é pós-modernidade? Resumo de uma falência da modernidade.

O que é pós-modernidade? Resumo de uma falência da modernidade

O que é pós-modernidade? O resumo de um conceito tão complexo pode ser destrinchado em alguns pontos essenciais - este vídeo do professor Juremir Machado poderá ajudar nesta missão.
pós-modernidade é esse desencantamento em relação à ideia de um futuro garantido, certo, promovido pelas leis da história, necessariamente melhor, redentor. Ela [a pós-modernidade] é a construção de um presente possível.
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Jean François Lyotard
Nesta palestra, o professor Juremir Machado tenta explicar o conceito de pós-modernidade. O que é pós-modernidade? Pós-modernidade, segundo o professor, pode ser descrita como o momento em que (tomando Lyotard como influência) todas as grandes narrativas entram em crise.
As grandes narrativas são as grandes explicações sobre o mundo, sobre a história, sobre a vida e sobre o futuro, entre as mais influentes: o marxismo, o cristianismo (e as religiões em geral), o iluminismo com o sonho da sociedade racional e etc e etc. Essas narrativas só podem ser chamadas de narrativas na percepção da pós-modernidade, pois para si, elas são o fundamento do mundo, a estrutura última da realidade – a teoria da história marxista não é somente uma narrativa, mas uma tentativa de explicação universal da história, da mesma forma, o projeto iluminista visava a universalização da razão e o cristianismo a universalização de seu próprio Deus.
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Juremir Machado
Desta forma, segundo Juremir Machado, o núcleo da pós-modernidade (em resumo) é a negação de qualquer fundação. Não há um “real realmente real”, mas unicamente narrativas que estruturam a realidade. Sendo assim, toda e qualquer visão de mundo, quando tenta ser verdade, se coloca em uma posição totalitária em relação àqueles que estão sendo sujeitados por ela.1
Essas narrativas – visões de mundo – que indicam um caminho para o futuro, um projeto utópico, é aquilo que é negado pela pós-modernidade. A falta da certeza nas grandes narrativas indica a impossibilidade de se prever o futuro com certeza filosófico-científica, portanto, o que nos resta é o presente. O presente precisa ser modificado e vivido, seja ele bom ou ruim.2
Juremir Machado explica que, não havendo uma estrutura verdadeira baseada naquilo que é real, a pós-modernidade nega a materialidade como definição daquilo que de fato é o real, mas atribui a realidade ao sentido que os sujeitos podem dar às coisas. A forma como esse sentido é dado é variada e cada linha de pensamento tem sua própria maneira de explicar a construção da realidade, mas o fundamental é essa experiência do mundo como algo que precisa de sentido, pois nele mesmo não há nenhum.
Sem a prisão em narrativas legitimadoras, não há prisão em maneiras de ser para o sujeito, o que o torna dono de sua própria liberdade (mas isso não deve ser visto como algo bom, tomando uma visão liberal-filosófica – Bauman nos ensina muito sobre os males desta suposta liberdade).

O que é pós-modernidade? Resumo da tragédia

Caso tentássemos explicar o que é pós-modernidade de maneira rápida, em resumo poderíamos dizer que é a:
A) Crise da ideia da filosofia como construtora da verdade;
B) Crise da ideia de certeza;
C) Crise das Utopias.
Segundo Juremir, ao falar sobre uma suposta universalidade ou convergência no pensamento pós-moderno, “quando a gente diz ‘a pós-modernidade diz…’ – eu já usei essa frase várias vezes -, essa é uma frase profundamente falsa, a pós-modernidade não diz nada, não é uma plataforma política, não é um grupo que se reuniu em algum lugar para criar o manifesto pós-moderno, assentar as bases da pós-modernidade, eleger a direção da pós-modernidade. A pós-modernidade é uma série de discursos sobre um momento”.
E continua,
Sergio Paulo Rouanet fez um exame dizendo que não há pós-modernidade, porque o modo de produção não teria se transformado, pois continuamos no sistema capitalista, mas nenhum pensador da pós-modernidade jamais imaginou que a pós-modernidade fosse uma superação do capitalismo, a pós-modernidade é o próprio capitalismo […] [é] a expressão última do capitalismo. Não necessariamente do neoliberalismo […], mas é o discurso da época em que as pretensões utópicas de superação do capitalismo desapareceram.

Lyotard e a grande narrativa

lyotard
O que é pós-modernidade? Para Lyotard, essa condição de descrédito – própria deste período – às grandes narrativas se deu, além do desenvolvimento do capital, pela própria lógica interna da ciência (que seria o saber legitimador da contemporaneidade). O ceticismo interno faz com que a prova da prova não seja provada. É necessário um a priori, algo que não pode ser duvidado, e se é necessário um a priori, então a ciência não é mais do que um jogo de linguagem entre tantos outros.
Desta forma, a pragmática da pós-modernidade não é pautada em um fim teleológico ou em um bem maior (não se busca uma sociedade igualitária ou o paraíso), pois estes já não tem efeitos de verdade prática. Ela é pautada na maximização da eficiência, que pode ser traduzido em: mais poder.
Num mundo sem grandes narrativas, mas recheado de inúmeros jogos de linguagem (e mediado por estes jogos de linguagem unicamente, que funcionam como o vínculo social na pós-modernidade), é unicamente o aumento do poder e da eficiência que garantem a reprodução infinita de um sistema, que garante seu aumento de performance e sua eficácia. O que isso significa? Significa que quem tem mais dinheiro (que é uma boa representação material da possibilidade de movimentar relações de poder eficientemente) pode favorecer aquilo que lhe interessa, pois não existe mais uma verdade ou uma justiça quase transcendental a serem consideradas para realizar o julgamento do válido e do inválido.
Mas aí nos deparamos com uma situação óbvia: quem tem mais dinheiro? Os capitalistas. Qual o interesse óbvio de capitalistas? A reprodução e otimização do sistema capitalista. O aumento de sua eficiência tem como resultado a constante transferência do saber – que era constitutivo do sujeito – para máquinas informatizadas. A decisão é tomada por um programa de computador, o saber é separado do sujeito e adquire quase uma vida própria, baseada em cálculos e probabilidades.
A ciência, apesar de ser somente mais um saber, ainda mantém sua importância,
Na idade pós-industrial e pós-moderna, a ciência conservará e sem dúvida reforçará ainda mais sua importância na disputa das capacidades produtivas dos Estados-nações. […]. Sob a forma de mercadoria informacional indispensável ao poderio produtivo, o saber já é e será um desafio maior, talvez o mais importante, na competição mundial pelo poder. Do mesmo modo que os Estados-nações se bateram para dominar territórios, e com isto dominar o acesso e a exploração das matérias-primas e da mão-de-obra barata, é concebível que eles se batam no futuro para dominar as informações. Assim encontra-se aberto um novo campo para as estratégias industriais e comerciais e para as estratégias militares e políticas (Lyotard em A Condição Pós-Moderna)
Mas Lyotard não vê na queda das grandes narrativas algo a se afastar. É a abertura da possibilidade de lidar com a incerteza, com aquilo que não está garantido. Em resumo, pós-modernidade fortalece a luta de saberes menores, dominados historicamente, suprimidos em relações de poder quase solidificadas, ela desqualifica o saber maior, legitimamente, e coloca a legitimidade na própria força do saber. Ou seja, se o que vale é a eficiência, então não é necessário justificar aquilo que eu luto. Eu simplesmente luto e quem não gosta que deverá me parar.

A modernidade líquida de Bauman

Bauman
A abordagem de Bauman se difere de Lyotard na medida em que o pensador polonês procura explicar as relações sociais a partir (principalmente, mas não unicamente) da sociologia, deixando a análise discursiva, a linguagem, para segundo plano.
O autor prefere chamar o tempo em que vivemos de modernidade líquida, em vez de pós-modernidade. Não há uma clara ruptura, mas sim uma mudança na continuação da modernidade.
É necessário mudar o rótulo para não ser confundido com autores que, de uma forma ou de outra, dão aval para a situação global que encontramos. Afirma Bauman[1],
Uma das razões pelas quais passei a falar em “modernidade líquida” em vez de “pós-modernidade” (meus trabalhos mais recentes evitam esse termo) é que fiquei cansado de tentar esclarecer uma confusão semântica que não distingue sociologia pós-moderna de sociologia da pós-modernidade, entre “pós-modernismo” e “pós-modernidade”. No meu vocabulário, “pós-modernidade” significa uma sociedade (ou, se se prefere, um tipo de condição humana), enquanto que “pós-modernismo” se refere a uma visão de mundo que pode surgir, mas não necessariamente, da condição pós-moderna.
Procurei sempre enfatizar que, do mesmo modo que ser um ornitólogo não significa ser um pássaro, ser um sociólogo da pós-modernidade não significa ser um pós-modernista, o que definitivamente não sou. Ser um pós-modernista significa ter uma ideologia, uma percepção do mundo, uma determinada hierarquia de valores que, entre outras coisas, descarta a idéia de um tipo de regulamentação normativa da comunidade humana e assume que todos os tipos de vida humana se equivalem, que todas as sociedades são igualmente boas ou más; enfim, uma ideologia que se recusa a fazer julgamentos e a debater seriamente questões relativas a modos de vida viciosos e virtuosos, pois, no limite, acredita que não há nada a ser debatido. Isso é pós-modernismo.
Ao contrário do relatado, para Bauman, tudo ainda pode ser debatido.
É por isso que o autor pontua a modernidade líquida como um momento de exaltação da liberdade individual. Ao contrário da modernidade, em que a criação de uma ordem que teria poder de controle superior para manter o projeto de sociedade nos eixos da história, a liquidez é resultado (e também causa) da troca da segurança – presente em sistemas controlados – pela liberdade (que foi podada gradativamente quando a segurança passou a ter papel central na sociedade moderna).
O conceito de liberdade para Bauman deve ser visto em analogia ao líquido viscoso,
imaginemos um barril repleto de resina, alcatrão, mel ou melaço… Ao contrário da água, a substância grudar-se-á, aderirá minha pele, não me soltaria. Mais do que exuberantemente invadindo um elemento novo e estrangeiro, sinto-me invadido e conquistado por um elemento do qual não há como fugir[2].
A liberdade, portanto, precisa de poder. Não de um poder proprietário, mas sim de um poder relacional. “A liberdade é uma relação – uma relação de poder. Sou livre se, e somente se, posso agir de acordo com a minha vontade e alcançar os resultados que pretendo alcançar”[3].
Na modernidade líquida, o estranho é tão odioso quanto o líquido viscoso. Em cidades protegidas, com sujeitos residindo em casas com câmeras de segurança, escritório altamente seguros, o estranho não é tão odioso, pois ele é o sujeito que se submete a trabalhos que ninguém mais poderia aceitar, é aquele que vende especiarias em uma camelô, que vende comida típica na calçada. Enquanto não atrapalham a liberdade consumidora dos moradores cidade moderna, eles não são reconhecidos como um perigo.
No entanto, a recente crise migratória mostra como são tratados quando deixam de ficar em tal posição subalterna e passam a procurar ativamente por espaço.
O estranho, aliás, é um conceito de época. Para Bauman, se na modernidade o estranho era aquele que não se encaixa nos diferentes projetos de sociedade (como o judeu no nazismo), na modernidade líquida, eles passam a ser os desempregados crônicos, os excluídos, que não podem entrar na sociedade de consumo.
A segurança, por sua vez, tem relação direta com a previsibilidade. O que significa que a falta de segurança na modernidade líquida é, para além da possibilidade de se sofrer agressões físicas, a incapacidade de garantir a permanência dos sujeitos em suas posições sociais ou de garantir alguma ascensão social. A insegurança também se manifesta na constante angústia vivida que está tão mais presente em nossa vida quanto mais tentamos nos aproximar de alguma fixidez nos laços humanos.
A explicação de Bauman passa por Bourdieu, já que a insegurança dita pelo autor é estrutural. Se trata do medo marcado no sujeito em sua constituição,
A liquidez moderna resulta em uma infinidade de experiências secundárias da morte, de exclusão e, portanto, na construção cotidiana e tijolo por tijolo de uma insegurança estrutural. Insegurança essa, que promove a criação e a utilização de técnicas e tecnologias para a proteção[4].
Os resultados da insegurança somados ao da liberdade consumidora atravessam desde relacionamentos amorosos frágeis, pouco duradouros e preteridos pelo consumo de grande quantidade de parceiros (qualidade em detrimento da quantidade), até o distanciamento de pais e filhos: os primeiros se transformam em agentes corruptores da santidade imanente dos últimos.

Referências

[1] ↑ BAUMAN, Zygmunt. A Sociedade Líquida. Entrevista à Maria Lúcia Garcia Pallares-Burke. Folha de S. Paulo, São Paulo, domingo, 19 de outubro de 2003.
[2]  ↑ BAUMAN, Zygmunt. O Mal Estar na Pós-Modernidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1998, p. 39.
[3] ↑ BAUMAN, Zygmunt. O Mal Estar na Pós-Modernidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1998, p. 39-40.
[4] ↑ SIQUEIRA, Vinicius. Medo Líquido – Zygmunt Bauman: uma resenha. Colunas Tortas, acessado em 04/06/2016.

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