Dois méritos e só


 Na foto: Intervenção apolítica na Av. Paulista, em Maio de 2015.


Nota máxima para o clichê ideológico
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Dois méritos e só

O texto de Joel Pinheiro da Fonseca tem apenas dois méritos: o primeiro, dizer que critica a supressão da primeira pessoa nas redações; e segundo, sua conclusão chega a dizer que vivemos uma falta de maturidade intelectual. E só!


De resto é um texto que não nos leva a conclusão a que ele chegou; portanto, é um texto com pouca coesão discursiva, como um todo, e cheio de implícitos. É um texto com profunda imaturidade intelectual, com argumentos refutáveis - chega a dizer que o uso de medalhões das ciências humanas e de discurso "antimercado" e "anticonsumo" é coisa de quem fez ou faz Pedagogia. Vale ressaltar, como forte ressalva, que a maturidade se adquire com leitura e bons debates, é assim que os alunos vêm conseguindo cada vez mais aprovação nas melhores faculdades do país. Ler cedo, ter bons interlocutores em casa ou na escola, sejam colegas ou professores das diversas áreas do saber. Ou seja, note que ler grandes pensadores ajuda a encontrar a sua maturidade intelectual e saber escutar a opinião dos seus mentores é fundamental para conquistar a autonomia, como sujeito histórico.

O texto descamba. É um péssimo texto. Ficaria abaixo da nota 6,0 que os alunos das escolas onde trabalhei e trabalho nestes últimos 18 anos. Como doutor em linguística dói em mim ler textos assim publicados no jornal de maior circulação do país. Se eu colocar duas dissertações de alunos com potencial de aprovação ao lado deste texto, os alunos vão ter fundamentação melhor, em 30 linhas, e uma visão mais global e inovadora do que a do economista do site spotniks.com(site engraçado em que se encontram uma diversidade de péssimos argumentos. Então fica uma pergunta: não sei o que a FOLHA está dando trela para esse tipo de comentário superficial sobre uma matéria (Redação) tão cara para o ensino brasileiro?!).

Para finalizar, esse discurso querendo desmoralizar a redação do ENEM está ficando fora de moda. Basta notar que a prova de proporção nacional cobra do aluno praticidade e conhecimento de mundo. Chegou, nos últimos anos, para fazer o aluno pensar a longo prazo e não de forma imediatista. Na prova o aluno pode falar mal do governo, pode falar mal dos programas implementados, mas tem que dar base a seus argumentos, tem que equilibrar a sua fala com ética e bom uso da língua portuguesa. Uma redação tira zero por desrespeitar os direitos humanos, mas não tirará zero por ser uma ótima crítica ao governo. O que o ENEM quer? Autoria e criticidade. Como conseguir? Lendo o mundo, escrevendo toda semana, debatendo cada texto e dialogando.

Meninos e meninas, continuem na árdua tarefa, se quiserem, de ler Adam Smith, Kant, Karl Marx, Spinoza, Foucault e Bauman além de já lerem o mundo que os cerca! Só assim vamos conseguir afastar os "Joel Pinheiro da Fonseca" dos jornais de grande circulação!

Por isso indico Marx! Pra ler! Lá no Capítulo 1 do livro 1 de O Capital ("O Fetichismo da Mercadoria e o seu Segredo") tem algo lá que serve até para economistas que não leram Marx, como o Joel.

Quem sabe assim o próximo texto do Joel ganha mais um mérito: ter lido algo imprescindível para qualquer intelectual do século XX e XXI. Apesar que para ser articulista da FOLHA não é preciso ter maturidade intelectual pelo jeito.

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Gosto de todos os livros e textos de Eduardo Giannetti, (pai de Joel), inclusive na semana passada ele deu uma das melhores palestra na FLIP ao lado de um Neurocientista, Sidarta Ribeiro, que fiz questão de ouvir. Giannetti é um bom pensador brasileiro. Mas Joel pisou bem na bola, por vários motivos:

1) Nítido como o discurso da Polarização atual no Brasil invadiu seu texto. Dá pra ver o antiPetismo, oantiFreirismo, o antiMarxismo. Lembrou aqueles cartazes das manifestações de 15 de março e 12 de abril: "abaixo a marxização e freirização das escolas".

2) Ele não leu as 250 melhores redações. Falou por alto. Eu li mais de 1000. Trabalho com isso. ;) Nelas havia aluno que toma partido em não proibir a propaganda infantil, que teve uma postura prol mercado, crítico ao governo. E outras tantas redações com nota 980, 960, 920 que faziam o mesmo percurso autoral. Coordeno dezenas (conheço mais de uma sentena) de corretores do ENEM que já me confirmaram que há textos muito bons e com pensamento acima da "cliché". Afinal, o manual do ENEM é bem explícito: cobra autoria do aluno.

3) Longe de mim, dizer que um não-especialista na área não possa opinar. Ainda mais pq gosto de ter, nos grupos em que trabalho, pessoas com formação em Direito, Filosofia, Pedagogia, Engenharia, Matemática, Medicina. Afinal, quando se é bom leitor e escritor a área de saber é apenas um trampolim para o próprio saber. Contudo, o que Giannetti faz tão bem, Joel faz mal. Primeiro tem que ler todos os textos ou conversar com especialistas da aérea antes. Não basta ser filho de pesquisador. Tem que ser pai da pesquisa. 

4) Sobre a bitolação na redação, concordo que há, por isso os dois méritos que disse do texto dele. Pois aponta duas causas (a supressão do eu e a falta de pensamento intelectual maduro), mas não aponta saída para elas. Repara no texto. Fala mais do mesmo. Não investiga as razões dos bons textos, só o lado negativo, a bitola. Não mostra como sair da bitola. Por exemplo, ler um autor e reconhecer nele um pensamento acima do comum e discutir com os amigos ou pais. Ou mesmo fazer o que estamos fazendo agora, que é muito válido. Estamos debatendo o conteúdo de um texto da FOLHA e as sutilezas da colocação do autor. Poxa, isto em qualquer casa, escola, sala de aula ou mesa traz o "benefício da dúvida" e oferece o elogio de ir em busca de bons textos. Por isso, tem que ler os grandes autores. Tem que articular com eles pra sair da bitola. Este é um dos caminhos. 

5) Também concordo que ele não quis discutir Marx. Mas colocou-se nítido que falar de bitola de pensamento ou cliché ideológico tem que passar por "Análise do Discurso". Tem que passar pela idéia de que a palavra é signo ideológico, materialidade histórica, que o homem é um ser de relações políticas. Bebamos da fonte aristotélica que diz: "o homem é único entre os animais que possui a palavra" (Livro I da Política). Que quer dizer, que somos um animal político. E usamos a palavra com vies "ideológico", no bom sentido, o tempo todo. 

Aí peca. Aí erra feio. Pois notei isto (falta de leitura ou uma leitura sem biquinho) e apenas indiquei a leitura, em vez de Michel Pecheux ou Mikhail Bakhtin (especialistas na Análise do Discurso), de Marx. Lá no capítulo que diz que o que faz o valor das coisas é a "relação de troca". Digo que o valor de cada coisa no mundo está associado ao apreço socialmente estipulado. No trecho em que Marx chega a esta conclusão, ele chega a citar Shakespeare de uma forma arrasadora. Vale a pena ler. 

Depois se ele quiser. Posso mostrar tudo isso nas 70mil redações em que coordenei só neste primeiro semestre de 2015. 

Não é otimismo. É análise de dados e textos. Muito se fala por alto. Tem que ler. E fazer diferente do que se diz que falta. 

Tem textos bons. Alunos muito bons. E sabemos o caminho pra isso e encontrar alunos no futuro ainda melhores.  

O caminho é promissor, se formos pelo diálogo. 


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