A Dialogia e como tirar nota máxima na Redação da Fuvest

O conceito de 'Dialogia' que leva o título deste blog tem origem socrática, no conceito de Diálogo - contudo atinge seu ápice na filosofia de Mikhail Bakhtin (1895 -1975).


A palavra 'dialogia' vem imediatamente da palavra 'diálogo', esta palavra tão cara à construção da Redação e daquilo que é o Ser Humano, seja engenheiro, médico, professor, arquiteto, pedreiro. Pois, diálogo requer dois, requer o social, requer contexto, requer dilemas, requer questionamento, mas também requer escuta, gentileza e educação.

Quando se abre um diálogo, abre-se uma porta que fala e duas que ouvem. Uma que diz e duas que ponderam. Uma que refrata e duas que refletem.

Dialogia é o movimento que o diálogo abre. Se a dialética precisa de dois, complementares, oposto ou parceiros, a Dialogia precisa de três partes: interlocutores; o tempo-espaço (contexto); e a ideia democrática de que o diálogo se abre a cada palavra.


Fazer Redação ou escrever uma Redação é uma atividade Dialógica plena, pois se lê a realidade (o contexto), por meio de jornais, periódicos, revistas, filmes, redes sociais; abre-se diálogo com alguém (um leitor universal, um corretor de vestibular, um professor, um amigo); e se abrem os ouvidos para prestar atenção no que o outro ouve e constrói como lugar de visão, como ponto de vista sobre o que vê, sente, escuta e pensa para que você, democraticamente, trabalhe a liberdade da palavra que lhe foi lançada (usar o ponto de vista do outro como ponto de partida é uma arma pra se escrever sobre a sociedade).


Escrever Redação e debater são, muitas vezes, sinônimos. Redação é pura Dialogia.



Neste fim de semana saiu a lista da Fuvest, vestibular para a Universidade de São Paulo, e a lista de aprovados trouxe boas novas, boas contas e boas resoluções, entre elas: a clara ideia de que escrever é uma atividade dialógica que precisa ser incentivada. (Esta é a ideia deste blog, por isto ele é feito por um coletivo de pessoas)



Há muito tempo as redações-modelo publicadas anualmente no site da FUVEST trazem redações 'modelo', isto quer dizer que são redações que servem como padrão, mas não necessariamente redações com nota máxima (por exemplo, no ano passado tivemos muitos alunos e amigos com as redações publicadas no site da FUVEST, foram 30% das 28 redações e nenhuma delas tinha nota máxima, pois as notas variavam de 6,7 a 9,4).



Este ano, tivemos contato imediato com pessoas que tiraram nota máxima na FUVEST, 100 pontos, com uma estratégia bem clara: fazer uso de um pensamento em metáfora, de uma analogia, de uma "ilustração" que permeasse todo o texto, que fizesse do início ao fim uma discussão do tema, mas que também trouxesse uma tipo de postura que pensasse em paralelo. Sim, fazer este tipo de 'ilustração' é sofisticado, difícil e requer diálogos (no plural), pois é preciso LER LIVROS, anotar pensamentos, LER revistas, anotar dados, LER o mundo, refletir sobre o homem, para escrever um texto que valha uma nota máxima no vestibular mais tenso do país.



Para passar no Vestibular basta uma nota 5,0 em redação. Mas meu desafio era maior, pois a escola que queria meus serviços de coordenador, queria entender qual a razão de não aprovar tanto na USP - pinheiros, já que aprovava muito em outras escolas. A dica era simples: melhorar o sistema de correção, em que cada redação fosse comentada, para que a redação servisse de diálogo com os pais e outros professores e amigos; arrumar interlocutores aos melhores alunos, como forma de diálogo, mas este tinha que ser dinâmico, tinha que ter movimento, causar instabilidade, por isso tinha que ser Dialógico; e arrumar pessoas com bom trato humano, que tivessem um potencial inesgotável de diálogo, pois liam, estudavam, falavam respeitando o outro.

Já que a Escola, queria aprovações em vestibulares de Medicina, tínhamos que incentivar o diálogo, a escuta, a escrita, a gentileza, a humanidade, pois seriam e serão futuros médicos e se queremos um trato humano melhor teríamos que dar exemplos, ter bons exemplos. Por isso, trabalhamos duro, para que cada aluno tivesse a possibilidade de diálogo com um atendente de redação (espécie de corretor e professor disponível ao diálogo em hora agendada). Mas, ressalto, isto só daria certo com um grupo de professores de todas as áreas, coordenadores atentos e funcionários da limpeza ao pedagógico sabendo que trabalhamos com educação. Uma escola sem seres humanos e educando seres humanos não obteria resultados. Por isso, boa parte das aprovações passa por cada um dos professores das diversas áreas e por todos os funcionários (o homem é cultural e ensino se faz em equipe).

Resultado, aprovamos mais de 300% a mais que nos anos anteriores em 2012, em 2013 atingimos a marca da segunda melhor escola em aprovações na Pinheiros e este ano mantivemos a colocação e poderia ser melhor, pois só foi travada por uma cultura ainda careta que privilegia a palavra autoritária, em que o professor diz, o aluno reproduz. Para mudar, precisamos de um ensino que diz e que o aluno pense (pesquise o exemplo da Finlândia, melhor ensino do mundo, declarado por entidades internacionais).



Pra o vestibular cria-se automatismos, quando deveria criar autonomias. O exemplo das duas redações nota 100 na FUVEST este ano faz com que o caminho que escolhemos seja o mais promissor possível, o caminho é a dialogia.

Sobre as duas redações com nota máxima na FUVEST:



1) A primeira é uma redação de um professor de escola de redação em São Paulo, chamada Ponto Final, que foi fazer o vestibular só para fazer a redação. Caso atípico e claro de quem está testando o vestibular, buscando o dado empírico. Ele fez o vestibular sem a pressa e a tensão do vestibulando, e foi até a prova para fazer uma 'ilustração'. E fez uma maravilha de texto, pois trabalhou com uma obra-prima de Ernest Hemingway, "O Velho e o Mar", na qual um pescador de idade avançada luta pela sobrevivência e coloca o leitor em questionamento existencial sobre o valor da vida que sempre está por um fio, um anzol, na boca de um peixe que pode lhe dar a fama e o sucesso em vida. A metáfora do "O Velho e o Mar" coube muito bem ao tema que trazia uma declaração desagradável do vice-primeiro-ministro japonês, que disse que "os velhos deveria apressar-se para morrer".

O texto dever ter ficado maravilhoso. Ainda não o temos, pois poderá ser publicado no site das redações modelo da FUVEST em Abril. Resta-nos aguardar.

2) O segundo texto é de um aluno de 19 anos, que não fez aulas particulares, mas assistia todas as aulas do cursinho e fez atendimentos pessoais comigo. Este é um típico dez mágico e de um vestibulando que se preparou para isto. Durante o ano escreveu bastante, mas não se destacava. O que valeu foi o tempo do final do ano, em que dialogava mais e conversava bastante com os amigos, já que tinha mais tempo para conversar, após o período maior de aulas ter terminado em outubro.

O aluno enviava-me e-mails de dúvidas e questionamentos pontuais. Eram dúvidas e coisas concisas, e que já traziam um pensamento voraz, pontual e bem promissor. Pelas redes sociais troco mensagens com muitos textos de alunos, mas os textos dele chamavam a atenção pelo nível dos questionamentos, pois eram todos realistas e passeavam pelos 'deslimites' da teoria e da vida. Assistia vídeos  sobre filósofos, e me questionava sobre a possibilidade da cultura ser uma invenção de opressão, e de ser a língua culta uma forma de manutenção do poder por parte de alguns. Nota-se aí o pensamento acima do comum, pois estava questionando os bens simbólicos do homem como ser cultural.

No vestibular da USP, ele foi aprovado pela redação, pois passou com nota 100, nota máxima na redação. Só para entendermos, a nota do primeiro dia dele foi 81%, isto quer dizer que fez nota 62% nas questões de português. A nota do segundo dia foi de 67% e no terceiro dia 81%. Ele entrou na Santa Casa na primeira lista. Uma imensa conquista. Para quem quer medicina a média deve ficar acima de 80% em todos os quesitos.



Como ele tirou nota 100%, por puro mérito. Por capacidade de escuta. Lembro que falar com ele é sempre um diálogo em que um respeita o outro. Fomos talhando as parte, fomos conversando, e o último questionamento dele foi sobre o conto "A Terceira Margem do Rio" de Guimarães Rosa.

E foi dito, discutido e feito.

Ele usou a 'ilustração' da "Terceira Margem do Rio" na prova da FUVEST, pois sabia muito bem o que estava fazendo, já que havia lido, discutido, relido e a primeira coisa que pensou foi no conto de Guimarães Rosa.

Em suma, ler faz bem, mas ter com quem conversar faz seus textos ganharem um status de Diálogo, e com isso Redação é Dialogia.


E Dialogia é tudo quanto o homem possa acreditar e sonhar de melhor para o seu outro.

Agora, você, caro leitor, tem em seu vocabulário não só mais uma palavra, mas uma palavra que pode mudar sua conduta pela vida.

Dialoguemos!

Fabrício Oliveira
Colaborador da Equipe do 'Redação e Dialogia'

Comentários

  1. Professor descobri este site ontem, e confesso que quando vi o discurso do filme sobre Hannah Arendt me senti feliz e triste ao mesmo tempo. Feliz por ter achado este blog fantástico ! mas também triste porque o ano já está acabando e bate aquela deprê ... enfim, já tens um frequentador assíduo do blog. Abs !!!

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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